Direitos dos Extrativistas no Mercado de Carbono

por Mary Allegretti

Na Amazônia cresce a pressão de empresas privadas sobre comunidades tradicionais para assinarem contratos de carbono sem conhecimento nem entendimento prévio a respeito das regras previstas em papéis entregues para lideranças em troca de expectativas de remuneração bem acima do comum. Contratos assinados foram questionados na Justiça, processos foram abertos, o MPF passou a monitorar a área e, mesmo empresas que desenvolviam projetos com metodologias consideradas adequadas, buscando respeitar os direitos das comunidades, acabaram cancelando contratos por insegurança a respeito do futuro. As poucas boas iniciativas criadas em anos recentes vêm avançando, ajustando metodologias, mas o tempo ainda é curto para avaliar os resultados. 

Para enfrentar esse desafio, de janeiro a dezembro de 2023 o Instituto de Estudos Amazônicos – IEA realizou seis oficinas sobre Mudanças Climáticas, Florestas e Projetos de REDD+ (Redução de Emissões sobre Desmatamento e Degradação) em Reservas Extrativistas enfatizando os direitos das comunidades extrativistas ao pagamento pelos serviços socioambientais prestados à proteção do nosso Planeta. Participaram das Oficinas 385 extrativistas, sendo 54% homens e 46% mulheres.

Para alcançar esse resultado o IEA contou com a parceria do Conselho Nacional das Populações Extrativistas – CNS e com apoio de duas fontes financeiras principais: o EDF – Environmental Defense Fund e o ICS – Instituto Clima e Sociedade. 

Essas oficinas aconteceram ao mesmo tempo em cresceu a instabilidade nas iniciativas de projetos de geração de créditos de carbono na Amazônia e em outras regiões do Planeta, com críticas públicas a respeito da falta de consistência nas metodologias adotadas para certificação dos requisitos exigidos para a venda de créditos no mercado voluntário, tendo como resultado uma certa paralisação nas novas iniciativas em curso.

O debate no Congresso Nacional a respeito da criação de um mercado de carbono no país também gerou (e ainda gera) polêmicas e interpretações, a favor e contra, com argumentos muitas vezes distorcidos a respeito da finalidade desse mercado e a importância da legislação para inúmeros contextos no país, especialmente para as florestas e as populações que ali vivem. 

Nesse complexo contexto, penso que encontramos o melhor caminho: levar informação para as comunidades, atuar em parceria com as instituições representativas desse público e defender a necessidade de iniciativas consistentes de pagamento por serviços socioambientais (PSSA) para as inúmeras comunidades que contribuem para o equilíbrio do clima no país e no Planeta. 

Já alcançamos o consenso de que o mercado raramente remunera esses serviços a um nível mais alto que a pura e justa sobrevivência. Mesmo com todo interesse na bioeconomia da Amazônia, ainda não é possível visualizar acesso a renda que permita melhorar a qualidade de vida dentro da floresta. A combinação de diferentes serviços (redução de emissões de carbono, valorização da biodiversidade, proteção de fontes de abastecimento de água, restauração florestal), tendo consciência que, atualmente, o valor do carbono no mercado supera os demais, pode viabilizar essa mudança e assegurar a proteção das nossas florestas pelas novas gerações de moradores que ali se encontram, em dúvida se permanecem ou vão fazer a vida nas cidades. 

Além disso, esse esforço coincidiu, em alguns casos, com a iniciativa de estados da Amazônia de elaborar arranjos de REDD+ jurisdicional na esfera estadual e, para isso, realizaram oficinas de capacitação para o mesmo público. O fato é que existem hoje lideranças e comunidades mais preparadas para estabelecer parcerias, seja com os governos locais ou com empresas privadas, para desenvolver bons projetos de PSSA na modalidade REDD+.

Ainda são necessários ajustes entre as partes para se chegar a um consenso sobre o que, de fato e na prática, significa desenvolver projetos de carbono em Reservas Extrativistas que sigam as diretrizes elaboradas na primeira oficina realizada em janeiro de 2023, que foram amplamente divulgadas e podem ser acessadas aqui. Isso requer interlocução com o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), os governos estaduais e as empresas que atuam no mercado e têm demonstrado interesse em entender como trabalhar com comunidades e desenvolver soluções novas que, embora necessárias, ainda não estão consolidadas. 

O potencial de carbono nas unidades de conservação na Amazônia e a urgência em melhorar a renda das comunidades extrativistas justificam os esforços para articular os interesses e construir projetos consistentes e justos para todas as partes.  

Acesse aqui as Diretrizes elaboradas na primeira oficina realizada em janeiro de 2023

Diretrizes para Programas/ Projetos de REDD+ em Reservas Extrativistas

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