“O que nós estamos vendo é uma situação deprimente e criminosa. Hoje pela manhã eu vi a coisa mais escabrosa da minha vida em uma área da Resex Chico Mendes. A colocação de um seringueiro estava como se por ali tivesse passado um grande furacão. O infrator entrou com um grupo de pessoas e motoserras, derrubou as árvores todas, inclusive o castanhal, não fez nem serviço de broca, colocou fogo e, com as árvores sapecadas, já começou a jogar capim dentro dessa pauzada. Vivemos uma situação onde o poder público perdeu totalmente, e em absoluto, as condições de controlar esse processo, colocando em risco a integridade da Resex”, diz Júlio Barbosa, presidente do Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS) e residente na Resex Chico Mendes.
Informações recolhidas no território apontam para a existência de um grupo organizado em atuação na Resex Chico Mendes, sobretudo na área de Xapuri. Seus integrantes estão desmatando e ameaçando os moradores, com o objetivo de abrir mais áreas ilegais para a criação de gado no território da Reserva. Moradores da Resex apontam que foi levada uma grande quantia de motosserras para a região, centenas de litros de óleo queimado e gasolina, com o objetivo, segundo consta, de promover a derrubada de uma área de cerca de 2 mil hectares, com grupos armados e com urgência.
Nos últimos anos houve uma desestruturação do aparato institucional dos órgãos responsáveis pela fiscalização dos territórios protegidos na Amazônia. Hoje, o ICMBio encontra dificuldades para operar na região, enfrentando limitações que englobam desde a falta de recursos financeiros e humanos até a perda do poder de ação efetivo nesses territórios. A Polícia Federal, importante parceira nesse processo de monitoramento e fiscalização, também tem tido suas ações limitadas.
Esse cenário reflete o processo de desmonte realizado em órgãos federais em consonância com a visão adotada pelo Governo acerca das políticas para o território amazônico. E a situação tem se tornado ainda mais grave com a possibilidade da troca de comando da nação.
“Nós estamos vendo que a nossa Reserva está indo realmente para o chão”, afirma Júlio Barbosa. “Pessoas vindas de outros estados estão atuando para comprar a posse de seringueiros, retirar a madeira para exploração florestal e colocar pastagem para o gado. A aceleração da devastação está intrinsecamente ligada à possibilidade de Lula se eleger Presidente da República a partir de 2023, dificultando a ação dos criminosos. Daqui até o final do ano muita coisa de ruim pode acontecer dentro dos nossos territórios, não só da Resex Chico Mendes. Preocupa o fato de mudanças de governo demorarem para entrar em operação e esse será o tempo para criminosos fazerem mais atrocidades dentro da nossa Reserva”, explica Júlio.
“Fazer circular essa nota é um pedido de socorro dentro desse quadro que nós estamos vivendo aqui na Reserva Chico Mendes. Levando em consideração a nossa segurança, nós que somos os guardiões dessa Reserva, as pessoas que expõem a cara e fazem as denúncias, a gente corre um alto risco diante dessa situação. Isso traz, para nós, uma preocupação muito grande”, desabafa o presidente do CNS.
“Mas não podemos nos calar e permitir que a Amazônia seja devastada e que os povos tradicionais que nela vivem estejam sujeitos a qualquer tipo de intimidação ou violência. O mundo precisa, urgentemente, saber o que está acontecendo de real e de fato na Reserva Extrativista Chico Mendes nesse momento. Nos últimos 3 anos e meio, a ação do governo federal foi voltada para desmontar qualquer iniciativa de proteção da Amazônia, dos territórios e de seus povos. A continuar assim, em cinco anos a Resex Chico Mendes e outras Resex estratégicas para a Amazônia, poderão estar destruídas”, conclui Júlio Barbosa de Aquino.
Leia a carta que o CNS enviou para Luiz Inácio Lula da Silva aqui.