Por Sabrina Brito, publicado pelo Estadão
“Percebi que, com a capacitação, eu poderia contribuir significativamente para a causa das reservas extrativistas que precisassem desse conhecimento.” Foi assim que André da Silva Marciel, morador da reserva Chico Mendes, no município de Brasiléia, no Acre, passou a cogitar o estudo de créditos de carbono em cursos realizados no Norte do País pelo Instituto de Estudos Amazônicos (IEA) e pelo Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS).
“Esse curso pode influenciar a minha vida de várias maneiras, a exemplo da complementação da renda. Com ele, posso elaborar propostas, prestar serviços, fazer consultorias, etc.”, adiciona André. “Juntamente com a minha atuação no conselho deliberativo da reserva, posso também influenciar positivamente no dia a dia da comunidade, e, com isso, contribuir para melhorar a vida do coletivo e da minha família.”
O IEA trabalha principalmente com a capacitação de populações que vivem em reservas extrativistas para participar do mercado de carbono.
Esse projeto tem sido desenvolvido por meio de oficinas que abordam temas como o papel das comunidades tradicionais, a mudança do clima e a redução de emissões provenientes de desmatamento e degradação ambiental. Até agora, mais de 470 pessoas já foram capacitadas no Acre, Amapá, Pará e Distrito Federal.
“Cada vez mais as populações tradicionais, entre elas as extrativistas, estão sendo assediadas por empresas privadas para assinarem contratos de carbono. Frequentemente, esses documentos chegam para as lideranças sem que elas estejam devidamente esclarecidas sobre o tema, sem conhecimento prévio ou compreensão das regras associadas a esse tipo de projeto”, explica Daniela Bonamigo Zupiroli, diretora administrativa e financeira do Instituto de Estudos Amazônicos.
“Esses projetos deveriam agregar à vida das comunidades, e nunca dificultá-la”, acrescenta André da Silva Marciel.
Segundo ela, já existem registros de casos de contratos pré-fabricados que chegam até os líderes comunitários com promessas de remuneração que excedem o esperado e, ao mesmo tempo, com condicionantes que podem alterar profundamente a dinâmica da comunidade e o modo de vida tradicional.
“Nesse contexto, a capacitação de lideranças e comunitários é extremamente importante, uma vez que fornece a eles instrumentos para entender e questionar o que lhes é apresentado, bem como cria uma conscientização a respeito das mudanças climáticas e do papel fundamental que desempenham nesse cenário ao manterem a floresta viva”, afirma Daniela.
Segundo Mary Allegretti, presidente do IEA, essas populações são titulares dos créditos de carbono que gerados ao evitar o desmatamento, prestando um serviço socioambiental de proteção das florestas e do clima da mesma forma que acontece quando coletam o látex e processam a borracha, a castanha, óleos e outras matérias-primas da Floresta Amazônica.
O mercado de carbono foi criado durante a conferência ECO-92, no Rio de Janeiro. Trata-se de um grande sistema de compensações que envolve emissões de gases de efeito estufa. Assim, países, empresas ou territórios que não alcançaram suas metas de redução dessas emissões podem adquirir créditos de carbono daqueles que ultrapassaram os cortes estipulados na poluição do ar ligada ao desmatamento e à degradação florestal.