Em seu primeiro dia de governo, Lula trabalhou no restabelecimento de vários programas de proteção ambiental que haviam sido extintos ou enfraquecidos no antigo governo. Na última segunda-feira (02), o Diário Oficial da União divulgou uma série de decretos assinados pelo Presidente para retomar políticas ambientais enterradas por Jair Bolsonaro e revogar medidas da última gestão.
“Em menos de 24h o governo começou a transformar o discurso em atos concretos para reverter a sabotagem promovida por Bolsonaro e reconstruir a governança ambiental no país. Ainda falta muito, mas o que vimos neste início de mandato é um acerto e demonstra a importância que o tema ganhou na agenda de Lula”, avaliou o secretário executivo do Observatório do Clima, Marcio Astrini.
Um dos decretos reativou o Fundo Amazônia, criado por Lula em 2008, e que estava paralisado desde 2019 por conta de medidas tomadas por Bolsonaro. Com a reativação, o governo da Noruega e da Alemanha já se comprometeram a destinar mais recursos para o programa. O presidente da Alemanha, Frank-Walter Steinmeier, anunciou a liberação de 35 milhões de euros.
Lula também revogou uma das medidas mais repudiadas do governo Bolsonaro, o Decreto nº 10.966, de 11 de fevereiro de 2022, que instituiu o “Programa de Apoio ao Desenvolvimento da Mineração Artesanal e em Pequena Escala” e a “Comissão Interministerial para o Desenvolvimento da Mineração Artesanal e em Pequena Escala”. O Decreto era denunciado por ativistas, ambientalistas e governos estrangeiros como uma forma de legalizar o garimpo, sobretudo em Terras Indígenas.
“Foram quatro anos de muitos desafios para os povos indígenas, para o meio ambiente e para o mundo. O meio ambiente é a coisa mais preciosa para a gente, é água, ar, terra, então o que o Lula fez é o cumprimento da Constituição. Garimpo em Terras Indígenas é crime”, lembra o coordenador-geral do Conselho Indígena de Roraima (CIR), Edinho Batista de Souza, do povo Macuxi, em entrevista à Amazônia Real.
O Presidente ainda extinguiu a fase de “conciliação” das multas ambientais, criada pelo então ministro Ricardo Salles, a qual, na prática, serviu apenas para livrar os infratores. O decreto assinado prevê a reorganização do processo sancionador ambiental e pode evitar que R$ 18 bilhões em multas do Ibama prescrevam. O decreto também reorganizou as regras sobre conversão de multas em serviços ambientais, desfiguradas desde 2019.
Para o geógrafo e ecólogo, Carlos Durigan, em entrevista à Amazônia Real, o revogaço representa a retomada de políticas de enfrentamento ao desmatamento e ao combate a crimes ambientais. “Dá um firme e importante passo na reconstrução das políticas e estruturas necessárias para a retomada das agendas voltadas à conservação e o desenvolvimento sustentável de nossos biomas e ainda reposiciona o Brasil no seu papel de protagonismo nas agendas globais”, concluiu.
Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima – A recondução de Marina Silva à pasta ambiental após duas décadas é carregada de simbolismo até no nome, que incorporou o termo Mudança do Clima. A pasta foi totalmente reestruturada, após o desmonte promovido pelo governo Bolsonaro.
Ministério dos Povos Indígenas e Fundação Nacional dos Povos Indígenas – Promessa de campanha, a pasta tem a missão de “combater 500 anos de desigualdade”, conforme afirmou Lula em seu discurso de posse. Sonia Guajajara é o nome certo para fazer o que nunca foi feito pelos indígenas, ainda mais após quatro anos de ataques sistemáticos e nenhuma demarcação de terras. A nomeação de Sonia foi acompanhada pela indicação de Joenia Wapichana, a primeira Deputada Federal indígena do país, para o comando da Funai, que também mudou de nome e agora se chamará Fundação Nacional dos Povos Indígenas (era do Índio). Nunca antes na história brasileira uma indígena havia presidido a Funai ou assumido um ministério.
Garimpo – O Decreto nº 11.369 revoga ato de Bolsonaro que promovia o garimpo em áreas públicas e de proteção ambiental. O decreto nº 10.966, de 11 de fevereiro de 2022, havia criado o chamado Programa de Apoio ao Desenvolvimento da Mineração Artesanal e em Pequena Escala, apontado como uma das principais conquistas do lobby do garimpo no governo Bolsonaro. Sob a fachada da “mineração artesanal” e “em pequena escala”, estimulava atividade que hoje é industrial, com máquinas pesadas e logística milionária. Um levantamento do Mapbiomas mostrou que de, 2010 a 2020, a área de garimpo no país aumentou 495% em Terras Indígenas e 300% em Unidades de Conservação.
Conama – Despacho presidencial determina prazo de 45 dias para a reestruturação do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama). Bolsonaro reduziu a participação da sociedade e esvaziou o colegiado, até então o principal do país na área ambiental, criado em 1981. O objetivo da medida é rever o Decreto nº 11.018, de 30 de março de 2022, para “eliminar os retrocessos realizados na estrutura e no funcionamento do Conama, com vistas a dar cumprimento à decisão do Supremo Tribunal Federal na ADPF 623, a servir de fundamento para nova regulamentação do Conama, a fim de garantir a ampla participação da sociedade na definição das políticas públicas ambientais do país”.
PPCDAm – O Decreto nº 11.367 restabelece o Plano de Ação para a Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm), extinto por Bolsonaro em seu primeiro ano de governo. Criado em 2004, na primeira gestão de Marina Silva no Ministério do Meio Ambiente, o PPCDAm foi um dos principais responsáveis pela queda de 83% do desmatamento até 2012. Apesar da notícia ser excelente, não se trata ainda de um plano efetivo, falta detalhamento. Uma Comissão Interministerial Permanente de Prevenção e Controle do Desmatamento, vinculada à Casa Civil da Presidência da República, definirá e coordenará as ações interministeriais para a redução do desmatamento no país. O decreto também trata de planos para combater o desmatamento no Cerrado, na Mata Atlântica, na Caatinga, no Pampa e no Pantanal.
Fundo Amazônia – O Decreto nº 11.368 restabelece a governança do Fundo Amazônia. O ato libera para uso imediato R$ 3,3 bilhões que estão congelados há quatro anos no BNDES por decisão do governo Bolsonaro. Alemanha e Noruega, que haviam cortado doações, já anunciaram novos repasses. A retomada do Fundo se soma à aprovação, ainda em 2022, da PEC nº 32/2022, que retira doações internacionais do teto de gastos do governo, abrindo a possibilidade de mais recursos serem utilizados pelo governo para execução de programas da pasta ambiental, como o combate ao desmatamento.
CAR – Mudança na estrutura regimental dos ministérios devolveu a gestão do Cadastro Ambiental Rural (CAR) à pasta ambiental. Setores do agronegócio pressionavam para manter o CAR na Agricultura, como ocorria desde o início do governo Bolsonaro.
SFB e ANA – O Serviço Florestal Brasileiro (SFB) e a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) voltam à estrutura da área ambiental. No caso da ANA, inclui agora a regulação das concessionárias de saneamento no país.
Pró-Catador – Despacho determina, em prazo de 45 dias, a recriação do Programa Pró-Catador, lançado por Lula em 2010 e revogado por Bolsonaro em 2020, e a realização de estudos para revisão do programa Recicla+, criado pelo governo Bolsonaro no ano passado. O ato de Lula destaca a necessidade de expansão da coleta seletiva de resíduos sólidos, da reutilização e da reciclagem, além de reforçar o apoio e fomento à organização produtiva dos catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis, a melhoria das condições de trabalho e a ampliação das oportunidades de inclusão social e econômica para os trabalhadores do setor.
Multas ambientais – A reorganização do processo sancionador ambiental, desmantelado nos últimos quatro anos, pode evitar que R$ 18 bilhões em multas do Ibama prescrevam, como era o intuito no governo Bolsonaro.
Fim da conciliação ambiental – A alteração no Decreto que regulamenta a Lei de Crimes Ambientais retirou a previsão de “conciliação” ambiental, etapa criada na gestão Bolsonaro para beneficiar infratores.
Fundo Nacional do Meio Ambiente – O Decreto nº 11.372 altera a composição do conselho deliberativo do Fundo Nacional do Meio Ambiente, ampliando a participação da sociedade na decisão sobre a destinação de recursos da área. O ato altera o Decreto nº 10.224, de 2020, no qual Bolsonaro regulamentou a Lei que, em 1989, criou o FNMA. O conselho terá representantes do recém-criado Ministério dos Povos Indígenas, de organizações indígenas e comunidades tradicionais. Foram incluídas ainda organizações ambientalistas, a Secretaria Nacional de Juventude e a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), entre outros.
Exoneração de Eduardo Bim (Ibama) e Marcos de Castro Simanovic (ICMBio) – O Diário Oficial trouxe a exoneração de Eduardo Bim da presidência do Ibama e de Marcos de Castro Simanovic da presidência do ICMBio pelos serviços prestados ao bolsonarismo, contra o meio ambiente. Diretores das duas autarquias também foram exonerados.